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Existe exagero no diagnóstico e tratamento de deficiência de vitamina D?

Cintia Cercato

13/07/2018 04h00

Crédito: iStock

A vitamina D, rotulada popularmente como a "vitamina do sol", é produzida na pele quando esta é exposta à radiação solar. No entanto, a luz solar por si só nem sempre é capaz de suprir os estoques da vitamina, pois além de ficarmos muitas horas do dia em ambientes fechados, a capacidade de produção de vitamina D pela pele depende de outros fatores como idade, pigmentação (quanto maior, menor a produção), latitude (pior em altas latitudes) ou estação do ano (menor produção no inverno).

Além disso, poucos alimentos contêm vitamina D, como ovos, peixes, derivados lácteos, óleo de fígado de bacalhau ou alimentos industrializados fortificados.

Levanto em conta estes fatores, podemos dizer que a vitamina D é considerada um "nutriente problemático", com potencial de alto risco de deficiência. O que pode ser preocupante, uma vez que as ações mais conhecidas e estudadas da vitamina D estão relacionadas a saúde dos ossos, onde seu papel é crucial, regulando a absorção do cálcio. Dor óssea, fraqueza muscular, deformidades ósseas e fraturas são características clínicas de deficiência grave de vitamina D.

Nos últimos 20 anos, muitas pesquisas têm sugerido que a vitamina D possui outros efeitos que vão além da saúde óssea, como melhora de imunidade, redução de diabetes, doença coronariana e até efeito protetor contra o câncer. Entretanto, a suplementação de vitamina D visando tais benefícios é ainda bastante controversa e não recomendada por diversas sociedades médicas nacionais e internacionais.

O diagnóstico de deficiência de vitamina D se baseia na dosagem da 25(OH)D. O fato é que foram encontradas altas taxas de deficiência de vitamina D em pessoas saudáveis de todas as partes do mundo. Até os surfistas do Havaí estavam com os estoques de vitamina D em baixa!!!

Mas será que a epidemia de deficiência de vitamina D é real? Ou será que o problema está no diagnóstico?

Possivelmente, grande parte da alta prevalência de deficiência de vitamina D em populações saudáveis no mundo é artificial, criada por altos valores de corte no exame de 25(OH)D. O uso de tais valores de corte cria preocupação desnecessária e pode levar a uma reposição potencialmente irracional que não é isenta de risco de toxicidade, quando atingidos níveis de 25(OH)D muito elevados.

Assim, a Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia lançaram em conjunto, o Posicionamento de Intervalos de Referência da Vitamina D onde sugerem qual população deve ser triada para deficiência de vitamina D e quais os valores de normalidade devem ser adotados de acordo com a faixa etária e a presença ou não de doenças crônicas.

De acordo com o documento, as principais indicações para solicitação da 25(OH)D são:

• Idosos – acima de 60 anos;
• Indivíduos que não se expõem ao sol ou que tenham contraindicação à exposição solar;
• Indivíduos com fraturas ou quedas recorrentes;
• Gestantes e lactantes;
• Osteoporose
• Doenças osteometabólicas, tais como osteoporose, raquitismo, osteomalácia, hiperparatireoidismo;
• Doença Renal Crônica;
• Síndromes de má-absorção, como após cirurgia bariátrica e doença inflamatória intestinal;
• Medicações que possam interferir com a formação e degradação da vitamina D, tais como: terapia antirretroviral, glicocorticoides e anticonvulsivantes.

De acordo com o documento não existem evidências para solicitação de 25(OH)D para a população adulta sem doenças, portanto, a triagem populacional indiscriminada não está indicada. Em relação aos valores ideais da 25(OH)D, o documento sugere novos valores de corte que são mais baixos que os anteriormente utilizados para a população saudável:

• Acima de 20 ng/mL é o valor desejável para população saudável (até 60 anos);
• Entre 30 e 60 ng/mL é o valor recomendado para grupos de risco como: idosos, gestantes, lactantes, pacientes com raquitismo/osteomalácia, osteoporose, pacientes com história de quedas e fraturas, causas secundárias de osteoporose (doenças e medicações), hiperparatiroidismo, doenças inflamatórias, doenças autoimunes, doença renal crônica e síndromes de má absorção (clínicas ou pós-cirúrgicas);
• Acima de 100 ng/mL: risco de toxicidade e hipercalcemia.

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Sobre a autora

Cintia Cercato é médica endocrinologista pela USP (Universidade de São Paulo), que se dedica à obesidade desde que defendeu doutorado nessa área em 2004. É a professora responsável por essa disciplina na pós-graduação da Faculdade de Medicina da USP, onde desenvolve várias pesquisas sobre o tema. Foi presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso) e atualmente é diretora do departamento de obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
- Site: www.cintiacercato.com.br
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